segunda-feira, 30 de julho de 2012

Onde reina a Paz?! E vai como? De trem?


"There is no path to peace. Peace is the path."
 (Mahatma Gandhi)




Era uma sexta feira, aproximadamente  13:30h. Eu estava almoçando no mesmo restaurante onde almoço  praticamente todos os dias da semana. E esses são os momentos em que coisas interessantes, curiosas, acontecem: no lugar comum de nossas vidas.

Hoje é um dia diferente dos demais? Sim. Por que? Por tudo. Pelo fato de que hoje é hoje. Nenhum dia é igual a outro na minha vida. Nunca foram. Eu acho isso mais um dos muitos privilégios que Abba me concede. Só que, ainda assim, coisas se repetem, por mais que os dias sejam diferentes uns dos outros.

Além disso, acho que estou na TPM, ou saindo dela. Esse estado de espírito que se apossa de mim mensalmente desde os 26 anos mais ou menos. Mais uma das ocasiões em que posso dizer sorrindo da "piada": eu era feliz e sabia. Que maravilha a vida pré TPM. Estou eu, com TPM, numa sexta feira, um dia após o aniversário da minha mãe - na quinta - quando estava indo trabalhar e tocou no rádio "Gatinha manhosa", Adriana Calcanhoto cantando, e eu fiquei malzona. Minha mãe cantava essa música para me pôr para dormir quando eu era pequena. Quase choramos - ou melhor, choramos - quando liguei para dar-lhe os parabéns. Passei o dia borocoxô. Minha mãe está ficando velha, um dia ela irá embora... e eu estou longe dela. Eu estou só. Eu vivo só (sentiu, né? meu estado de espírito?). Na semana em questão nenhum dia fui na academia pela manhã. Fui à noite, quando muito. Fiquei as manhãs bolando na cama e me aninhando na colcha e no meu ursinho Teddy (e AI de que falar qualquer coisa dele! Têm um problema com meu ursinho Teddy? Hãnm!). Sexta, mais uma sessão de "é só hoje porque estou de TPM que vou ficar GORDA, OLEOSA e PREGUIÇOSA na cama, sem me odiar (muito) por causa disso"

Então levantei - gorda, oleosa e preguiçosa, verdadeiramente horrível - escondi da melhor forma que pude meu estado espiritual e físico (?) e fui trabalhar.

Estava almoçando. Ando distraída. Ando tão distraída... Me distraí. Só percebi um tempo depois. Embora acho que tenha sentido imediatamente... a familiaridade, sabem? Senti, mas não sei como registrei.

Não digo que me distraí porque comecei a falar de mim. Isso faz parte do meu sincericídio e da minha sozinhice. Não resisto. Falo meeeeeermo. rsrsrsrs Afe. Tenho até vergonha depois quando me lembro do tanto que falo de mim. E falo CADA coisa que "Jesus, Maria, José"!

Foi quando me fizeram uma pegunta. A pergunta que me fizeram foi a seguinte: "Quando você tem paz?" Bom, foi isso que me aconteceu... essa pergunta. E essa pergunta revela muito sobre quem faz a pergunta. É sempre bom encontrar uma pessoa que faz perguntas assim para pessoas que entendem perguntas assim.

Pois é. Engraçado que eu entendi perfeitamente a pergunta. Isso em si já tem um significado muito relevante. Acho que meu interlocutor, pelo pouco - nada - que o conheço, sabe tão bem disso quanto eu. Essa pergunta tem a função básica de não ser entendida.

Eu não só entendi como respondi imediatamente, talvez até meio na defensiva, não contra o "perguntante", mas contra mim, contra o mundo. Eu disse: "Eu tenho tido paz ultimamente". E ele devolveu: "Tem? Em que momento?" 

Ai ai.



É o seguinte: as pessoas "normais" acham que têm paz, pra efeitos práticos elas "tem" paz. Ou não sabem que não têm paz, enfim... é a mesma coisa, embora seja o oposto. Elas não pensam sobre isso, não se afligem com isso. Sabem? Isso pra comeeeeeço de conversa. Ou, se não ESTÃO em paz porque estão, digamos, "chateadas", elas encaram isso como um problema transitório. Quer dizer, realmente, as pessoas "normais" não entenderiam essa pergunta. hahahahah Dependendo do nível de "normalidade" até se ofenderiam ou estranhariam muitíssimo ouví-la. Não é - para a "normalidade" - uma questão de "ser", mas de "ter", como, aliás, quase tudo no mundo para "eles".

(Um parêntese: 


Engraçado que tem "vários tipos de gentes" no mundo. As vezes eu acho que reconheci ou encontrei uma pessoa do "meu modelo" (e haaaaaaaja aspas, né? mas e o jeito?!)... e acaba que é alarme falso. Logo depois de um tempinho eu percebo que neeeeem neeeeeeeeem. A pessoa nem sabe do que eu tô falando. Pensa que é um código secreto e fica lá toda minha brother e eu "ROINC".. pensando... "Aaah nem!".. kkkkkkk Não é que o "meu modelo" tenha nada de especial. É só um povo que pensa muito, que filosofa até (uns sem saberem ou admitirem), que gosta de ler e saber sobre todas as coisas, que presta atenção nos outros de um jeito que a maioria não presta, que presta atenção nos detalhes das coisas, que têm muita  curiosidade, têm uma certa cumplicidade entre si... não sei explicar. É um jeito de ser, de ficar sozinho, de sofrer, de estar triste e feliz, de se importar também, de perceber a beleza/tristeza/presença/ausência/estado das coisas. De ser persistente e de ser flexível ao mesmo tempo. Tipo: nunca admitir que é flexível porque tem orgulho de ser teimoso, mas não gostar de ser chamado de teimoso porque se considera muito flexível! hahahahaha Um jeito de envolver os outros ao seu redor, de se tornar conselheiro, de entender de "medicina", de ser dono da verdade e ainda achar que tem a humildade de reconhecer quando está errado (e reconhecemos mesmo, mas nunca estamos! kkkkkk). Enfim...


É possível que todo mundo tenha um amigo assim.. mas pra esse amigo ter OUTRO amigo assim não é tão fácil. E tem muita gente que gosta de fingir que é assim... como se fosse bonito. Nem é. Tem boa parte do tempo que é até doído... "do-í-do, não doido.. do verbo "doer".. dolorido, sabem? Mas é muito doido também... de "que coisa doida!" Somos meio chatinhos e meio bairristas... Yeah! Quando nos reconhecemos um ao outro é "mó bom"... já somos praticamente íntimos, afinal, é tanta semelhança, tanta compreensão, tanta dor e tanta inquietação, tanta dúvida que partilharmos! Isso nos aproxima mesmo do mais recente ex estranho que seja do nosso modelo... mas não somos excludentes dos outros, de modelos diferentes, até porque acho que uma característica nossa é ver com o olhar do outro (até mais do que com o nosso as vezes, embora não sejamos machos o suficiente de admitir essa "falha" com frequência: essa de que não gostamos muito de focar em nós e nos priorizar - embora nos analisemos tanto!)... e também porque conseguimos antecipar as coisas: eventos, atitudes, consequências, "coisas". Isso também nos deixa ora mais pacientes (porque sabemos o que nos irá chegar) e ora mais desesperados/ansiosos/impacientes (pelo mesmo motivo). Eu, particularmente, costumo ficar calma quando antevejo coisas boas e ansiosa quando estou incerta ou quando acho que é algo não-bom. 


Sei que passamos a impressão de afastar as pessoas... e afastamos algumas mesmo. Temos enorme apreço pela solidão... Uma coisa interessante é que "autorizamos" a permanência ao nosso lado, e até achamos bom, de pessoas que sabem ficar "sozinhas mesmo perto" ou que, não sabendo, respeitam essa nossa peculiariadade e nos dão espaço. Não é preciso estar só para ficar sozinho, se você quer saber. Tenho achado, depois de "velha" rsrsrsrs, que ficar sozinho junto é bem melhor. Uma coisa que tenho também é a memória associativa mais incrível! Coisinha que pode ser fantástica e inconveniente: as coisas se conectam... as músicas, histórias, piadas, momentos, lugares... E acho que temos bom coração...Mesmo! Estamos trabalhando nesse "trilho" (mais na frente você vai saber o que é trilho).


...mas chega de divagar e vamos voltar ao assunto: eu! kkkkkk Agora "sério": a paz! rsrsrsrs )

Eu "tenho" paz as vezes. Bem, na verdade, tecnicamente, eu considero que eu até vivo bastante em "não não-paz" hoje em dia... o que não é em "paz" exatamente, mas não é também "não-paz", é "não não-paz", o que é um certo tipo de paz... paz em sentido lato. Mas quando eu tenho momentos de paz (em sentido estrito), costumo saborear bem. Acho, como disse, que se falando em "momentos", até que tenho mais momentos de paz ou de "ausência de não-paz" do que de "não-paz".

É que as vezes começamos a abrir concessões pra as determinações que fizemos para nós, a partir das experiências que tivemos, e descobrimos que estamos perdendo a paz por nossa própria culpa. Isso é muito ruim. Bagunça a "não não-paz" e a paz da gente.

Também não acho que se trancafiar nesse perímetro pré estabelecido pelas experiências pregressas seja  "viver em paz" e ser feliz. Apesar de que quem fez/faz essa escolha, com certeza, me olharia com uma cara muito feia agora me desafiando a mostrar de que modo ele não vive na mais absoluta e invejável paz, numa vida bem melhor e mais alegre do que os "outros" que insistem em escolhas infelizes. Bom, na minha opinião - e no MEU blog a MINHA opinião é que vale (Noooosssa, ter um blog é muito bom pra quem não gosta de ser contrariado! Anti stress total!) - como eu ia dizendo, na minha opinião, se a pessoa vive numa zona segura, sem as "escolhas infelizes, erradas, equivocadas, controversas, whatever", ela pode não ter a ausência de paz causada pelo desgosto, pelas frustrações, pelos recomeços, pelos embates, blá blá blá, o que é lindo e ótimo, mas também ela não tem as recompensas dos acertos, o tempero de se arriscar em termo de relacionamento e de ser bem sucedido. A verdade é que, secretamente ou confessamente, todos queremos arriscar, mas não sob as mesmas condições. Alguns precisam de mais incentivo, alguns precisam de bons argumentos, alguns precisam que seu coração bata num ritmo que de orquestra.. não de Michel Teló. Viver no perímetro da ausência de conflito pode até deixar de fora a "não-paz", mas não confunda a "não não-paz" com a "paz". A paz tem um quê... um tempero de felicidade.

Tá bom. Confesso que tenho me sacaneado ultimamente no quesito paz. Por isso que a pergunta me deixou tão na defensiva. Por um lado foi bom, não porque tenha me mostrado isso - que eu já percebi, espertinha que sou - mas porque é um peso a mais na balança da "acordação", aquela do verbo "acordar". Acordar pra cuspir, pra Jesus, essas coisas.


"I am not only a pacifist but a militant pacifist. I am willing to fight for peace." 
Albert Einstein




Eu estou disposta a comprar essa briga comigo mesma, seja lá com quem for, pela minha linda paz. Só que, eu sou osso duro de roer, e não é fácil me dobrar. Tem coisas que preciso fazer e que fico ali, no enrolation-tion-tion, e isso rouba minha paz também, claro. O tique-taquear do relógio me enlouquece. Sim. Mas de que adianta uma louca estanque? Sou eu. Mudanças num ritmo muito lento quando se trata de eu, eu mesma e myself dentro do interior de mim mesma.

O comodismo é o inimigo mais mordaz da paz. Tendemos a espernear contra as ameaças externas à nossa paz, mas deixamos que o comodismo a sufoque lentamente, assistindo imóveis, desde que, definitivamente, confortáveis. Conforto é tudo!

Existem coisas pontuais que nos dão paz ou felicidade que, sei lá, se confundem as vezes: a paz e a felicidade, entendem? Elas se confundem as vezes!... Para mim a leitura, a música, cozinhar quando tô afim (mas aí tem a louça pra lavar depooooooiissss aaaaarrrghhh), atividade física não obrigatória, o sol na minha pele quando estou com frio, observar o mundo no parque.. na rua..., aprender coisas novas, viajar (iuppppppyyyy), filmeeeeees, shoppinterapia (quando tenho dinheiro... droga!), ver coisas boas acontecendo aos outros (pois é...), terminar um trabalho ao qual me dediquei direitinho. Continuar dormindo quando estou com muito sono. Ter a casa cheirosa e arrumada! Não é preciso muita coisa. Sou facinha! =)

Hoje cheguei a essa conclusão maluca - imaginem só - de que quase tudo, praticamente tudo que acontece conosco faz parte de uma decisão que tomamos. E a paz, a santa paz, não é exceção. Só que essa decisão pode ser consciente ou inconsciente.

Engraçado... pensando melhor.. eu não já escrevi sobre o poder das decisões? É tipo isso. Sob nova luz.

Ter certeza de algo! Isso é bem amplo, certo? "Aaaah! Mas EU tenho certeza." Uuuuiii! Para quem pensa antes de falar... não que este seja um grande grupo... mas, enfim, ele existe... afirmar a certeza não é assim simplizinho. "Eu tenho certeza". Pois muito bem, senhores e senhoras. Ter certeza é uma escolha: ter certeza de que é feliz ou triste. Ter certeza de que encontrou ou não o amor da sua vida! Ter certeza ou não de que se encontrou profissionalmente. Escolhas!!! Quando você decide que tem umas dessas certezas - e aqui é indiferente se você está maluco ou não, certo ou errado, respaldado ou não - é isso aí, mermão! Fechou, partiu!

A "certeza" só é confiável nas leis: leis da física, leis da matemática, etc! No campo dos pensamentos e decisões, ela é uma ilusão que nos dá segurança. Decidimos e, então, nos convencemos de que iremos fazer aquilo porque "temos certeza", e não porque, simplesmente, decidimos.



Vejam bem. Não estou falando que você decidir, que você escolher faz com que a coisa seja real automaticamente, apesar de que, com o tempo, quem sabe? Mas você passa a ter certeza. Ora, um sujeito pode resolver ter certeza de que é o Rei da Escócia, e aí? hahahahaha Vai ser chamado de louco, vai dizer que é uma conspiração - claro que é um exemplo chulo! - mas ele é o Rei da Escócia para si e pronto. Mas a feiosa pode resolver concorrer a Miss convicta de que é linda. E se eu resolver que tenho certeza de que sou bonita, ou de que sou excelente profissional ou de que amo o Fulano, para mim, quer o MUNDO concorde, quer não, eu sou bonita, sou uma profissional do caramba e Fulano é o homem da minha vida! Quem quiser que relinche! Que se explooooooooda! Booooooooom!

Então, melhor decidir conscientemente o que PUDERMOS, o que LEMBRARMOS e o que CONSEGUIRMOS! "Sou feliz, tenho paz, me encontrei na minha profissão". Beleza. Isso de "amor da vida", aí o buraco é mais embaixo porque envolve dois malucos tendo certeza da mesma coisa, senão dá merd@, então aconselho que a pessoa pense um pouco antes de "ter certeza"... maaaaas, né?

Pois então! Eu estava num casamento outro dia e vi os noivos lendo seus votos cheios de convicção. Quem disse? Eles. Eles disseram. Eles "tinham certeza". Pronto. Basta. 

Decida. Decida não sofrer. Decida gostar da sua companhia. Decida apreciar o que você faz, o que você tem, quem você é. E decida mudar para melhor tudo que estiver ao seu alcance. E MUDE. Decida mudar e mude. Seja macho! hahahahahaha

Decida correr riscos, mais ou menos calculados, e arcar com as consequências deles, sabendo que as vezes as recompensas compensam os riscos e que as decepções são proporcionalmente menores do que os benefícios almejados. Decida e encare. Ou decida não encarar e viva com isso. Viva bem com isso. A vida é sua. Tenha certeza de que você é uma pessoa excepcional: que vale a pena. Ninguém muda o perfil de ninguém, mas as vezes você mesmo muda o seu perfil por alguém. É assim que o mundo gira. 

Eu tenho certeza. Certeza absoluta, de que vale a pena tentar. Tentar o que? Ah! Um monte de coisa! Quer ver? Tentar ser feliz para começar. Tentar viver em paz, tentar se tornar uma pessoa melhor (o que vai deixar você feliz e em paz), saltar de pará quedas, se endividar para comprar uma coisa que você quer muito, deixar de se endividar e deixar de comprar uma coisa que não quer tanto assim, conhecer melhor as pessoas, assumir quem você realmente é, assumir que nem sempre quem você realmente é é tão legal, ver ópera, ver o futebol que você não gosta com o Siclano, perder um dia todo dormindo, acordar cedo para ganhar um dia! Sem fórmulas! Se não existissem tantas coisas legais diferentes no mundo, não haveria tanta gente também diferente para nos dar a oportunidade de experimentá-las a todas elas. Fazer as coisas que o outro gosta vale a pena tentar. Sim. Eu acredito nisso. Pela felicidade do outro, pela sua felicidade, pelo companheirismo... porque não teria graça um mundo de pessoas iguais nem um mundo mais individualista ainda. Experimentar coisas não tão legais é bom também, fornece parâmetro, ensina valores.

Eu não posso responder o por quê da minha ausência de sensação de paz, ou melhor, da minha consciência a respeito disso.Não posso responder com plena convicção, mas tenho lá meus palpites... uns compartilháveis, uns íntimos, uns que tenho preguiça de ficar explicando... acho que é multifatorial.




Acredito que estamos aqui, no mundo, para aprender, para ensinar (por que não?), para compartilhar experiências. Para nos tornamos pessoas melhores. Sim. Mas melhores do que quem? Do que nós éramos? Quando? Do que os outros? Que outros?

Acho que isso aqui não é concurso público! hahaha Não estamos concorrendo para ver quem é melhor. Mas é tipo um "ano letivo", temos que dar o nosso melhor, tirar a nossa nota mínima de aprovação... eu acredito em auto-aprovação... não em aprovação divina. Acho que Abba não tem qualidades e vícios humanos do tipo orgulho, vergonha, ofensa... Se tiver bom para a gente, está bom para ele. Então, pela minha lógica, nós temos que passar "de ano" conforme nosso potencial. E se existisse uma média? Média 5!? Bastaria um 5? Isso deixaria você em paz? Feliz? Se sim... então tá. Por hoje basta. Acho que independente da média, o que importa é o aluno. Um 5 para um aluno 4 é mais que 10.

Eu sempre fui nerdzinha... CDF, sabem? Na faculdade uma vez o professor de filosofia do direito passou uma programa gigante de estudo... na hora da prova só havia uma questão: "que nota você acha que merece tirar e por que?". Coloquei que merecia tirar um 10 porque havia estudado para tirar 10, e não 9. Essa sou eu. Pois é. Só que eu acho que na vida eu não tenho estudado para tirar 10 em toda prova... em toda matéria... e aí fico com essa "coisa". Posso até tirar boas notas... mas eu merecia?! Tipo fazer por onde... E isso não me deixa tão em paz assim.

E o que faz um aluno nota 10? Quem é ele? É o Stevie Jobs ou o Chico Xavier ou quem!? 

Um dia eu li a história de um grande sábio grego que viveu muuuuuuitos anos, mais do que a maioria dos sábios viviam e do que os homens de seu tempo. Ele se dedicou durante tooooda a vida a estudar filosofia, arte, música, ciência, línguas. Era um homem tão culto que se dizia que não havia outro como ele. Para poder estudar e aprender o máximo, se isolou e durante todo o tempo que viveu, esteve na companhia de estudiosos e de livros, mal falava... Um dia, perto do fim, lhe chamaram para que visse uma pessoa que tinha sido próxima a ele na juventude, alguém por quem um dia nutriu grande afeto. Essa pessoa estava doente, sofrendo muitas dores em seu leito de morte e lhe implorou: "Consola-me, conforta-me, diz-me palavras doces para que eu saiba que ainda me amas". E então, estupefato, o sábio se deu conta de que não sabia como fazer isso, não sabia como demonstrar sentimentos, como amar e cuidar de outro ser humano. E deixou a seguinte lição: "Construí durante toda minha um único trilho de trem, longo e sólido, mas  solitário. Hoje sei que o trem, para correr, necessita de dois trilhos paralelos. Não me resta tempo, contudo, para que volte ao início de tudo e construa ao lado do primeiro trilho, o segundo. Precisaria, para isso, de outra vida. Perdi toda essa minha existência, é assim que me sinto. Um trem precisa de dois trilhos e eu só construí um trilho para o meu. Sem sentimentos, de nada vale toda a minha inteligência. Falo fluentemente várias línguas, mas fiquei mudo diante do sofrimento."




Penso eu que, para ter paz, seria preciso a consciência de estarmos construindo os dois trilhos do nosso trem. Sem prestigiar um em detrimento do outro. Que teríamos que nos trabalhar como seres humanos em duas frentes: a emocional/moral e a intelectual. Podemos viver na "não não-paz", achando que temos paz porque vivemos a ausência de conflitos, mas quando nos dermos conta de que falta um trilho, saberemos que perdemos um tempo do qual não dispomos mais. Perdemos uma vida. Perderemos tantas "uma vida" bastem até que aprendamos? 

Esse dilema, essa angústia, me rouba "um pouco" a paz. Mas saber que não vivo na ignorância e que, por mais que seja minimamente, sou um ser melhor hoje, do que fui um dia e que, por mais que não possa ir longe, meu trem pode se adiantar um pouquinho que seja... porque por mais que estejam desiguais, estou construindo dois trilhos... E isso me dá paz. Me dá momentos de paz. 

Lendo o livro - o livro que mais me tocou nos últimos anos, um dos mais sensacionais que já li - Trem Noturno Para Lisboa, vi a história de um homem que comprou um piano de cauda. Já mais velho olhava para aquele piano como quem olha para um verdugo: o piano era a lembrança constante, era a presença da passagem do tempo. Ei-lo ali com o piano de cauda que nunca aprendeu a tocar e que agora já não tinha tempo de aprender... e que por não ter tempo de aprender, não se dignava a começar... e que por não dignar-se nem sequer a começar, sentia-se cada vez uma fraude maior. Todos temos pianos de cauda, reais ou potenciais. O fato de não podermos mais nos tornar (notórios) pianistas não significa que não possamos nos tornar (dedicados) alunos.

Isso lembra aquele poema que se atribui a Eduardo Alves Costa:



No caminho com Maiakóvski

"[...]
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
[...]"

É isso! A ausência de si mesmo. A inércia. O acovardamento diante da vida. Ser um aluno nota 5 quando você é um aluno nota 10. Isso é brabo.

A paz é, basicamente, um estado de espírito. É a certeza de que não somos devedores para conosco, ou o esquecimento de que somos. Da mesma forma que não se pode impôr ao homem o sentimento de inferioridade, não se lhe pode jamais roubar a paz. É uma daquelas coisas em que somos nós a nos espoliarmos, somos nós os carrascos, nunca o outro. O outro somente leva a culpa.


E com você? Tudo na santa PAZ? ;)








A Paz
Gilberto Gil

A paz invadiu o meu coração
De repente, me encheu de paz
Como se o vento de um tufão
Arrancasse meus pés do chão
Onde eu já não me enterro mais

A paz fez um mar da revolução
Invadir meu destino; A paz
Como aquela grande explosão
Uma bomba sobre o Japão
Fez nascer o Japão da paz

Eu pensei em mim
Eu pensei em ti
Eu chorei por nós
Que contradição
Só a guerra faz
Nosso amor em paz

Eu vim
Vim parar na beira do cais
Onde a estrada chegou ao fim
Onde o fim da tarde é lilás
Onde o mar arrebenta em mim
O lamento de tantos "ais"


Um comentário:

  1. Se esse texto não fosse tão bom e excepcionalmente bem escrito, eu até podia dizer que poderia ter sido escrito por mim, pois uma parte considerável dos meus pensamentos estão escritos aqui (inclusive a minha TPM de sexta-feira. Baita coincidência!).

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